terça-feira, 24 de agosto de 2010

O caso de Roberto.

Nasceu em 4 de março de 1948 e pouco se sabe de sua história pregressa. O pai é desconhecido e a mãe está internada como paranóica. Ela ficou com ele até a idade de 5 meses, sem residência fixa e negligenciando os cuidados essenciais. Precisou ser hospitalizado num estado de hipotrofia e desnutrição. Quando melhora, é devolvido quase que a força para a mãe. Aos 11 meses precisa ser novamente hospitalizado novamente com desnutrição. Agora está definitivamente abandonado pela mãe de quem não se sabe mais notícia. Devido a sua condição clínica, teve que viver nos mais variados abrigos, ambientes e hospitais, nunca tendo-se reproduzido o ambiente familiar. Ele chegou ao abrigo onde esta sendo atendido, aos três anos e nove meses. Tinha dificuldades no movimento da marcha e na linguagem, só sabia dizer duas palavras que gritava: Dona e O lobo! Esta palavra gritava o dia todo o que fez Rosine lhe chamar de menino lobo, sendo essa a palavra que o representava.
Do ponto de vista do comportamento era hiperativo, o tempo todo agitado por movimentos bruscos e desordenados. Perturbações variadas do sono, tinha crises de agitação convulsiva e berros dilacerantes; não podia suportar as portas abertas, o escuro e os gritos das outras crianças e sobretudo as mudanças de quarto. Mas raramente tinha crises diametralmente opostas em que ficava completamente prostrado, olhando sem finalidade, como depressivo. Com os adultos era hiperagitado, e não era capaz de manter contato. Quanto às crianças ignorava, só reagindo quando uma delas chorava ou gritava, entrando numa crise convulsiva. E agia com agressividade sendo preciso mante-lo amarrado a noite e durante as refeições. Rosine preferiu manter em tratamento sem saber muito bem em que categoria colocá-lo. O tratamento conheceu muitas fases, sendo a primeira com duração de um ano.
Ao longo da fase preliminar, seu comportamento se repetia durante as sessões. Agitado e com gritos guturais. Os objetos que tomava, logo rejeitava ou empilhava em cima dela. Nessa primeira fase notou que não se aproximava da mamadeira, e mostrava grande interesse pela bacia cheia de água, que vinha acompanhado de uma verdadeira crise de pânico. Essa fase preliminar de atendimento terminou em uma noite em que, após a hora de deitar, em pé na cama, com tesouras de plástico tentou cortar o seu pênis diante das outras crianças terrificadas.
Na segunda fase do tratamento, começou a expor o que era para ele o Lobo! Gritava isso o tempo todo. Começou um dia tentando estrangular uma menininha que eu tratava. Foi necessário separá-los e colocá-lo em outro quarto. Sua reação foi violenta, sua agitação intensa. Precisei vir e levá-lo para o quarto em que vivia de hábito. Logo que chegou lá, berrou: _ O lobo! E começou a jogar tudo pelo quarto, era o refeitório _ comida e pratos. Nos dias seguintes, cada vez que passava diante do quarto onde tinha sido colocado, berrava: _ O lobo! (p.112) Quando avistava uma porta aberta logo corria para fechar e gritava: o lobo! Um dia, quando tinha acabado de tomar a mamadeira, foi abrir a porta e estendeu a alguém imaginário. Este episódio levou Rosine a hipótese de que a porta aberta e o leite estivessem ligados.
No início do tratamento acreditava-se obrigado a fazer cocô na sessão, pensando que se me desse alguma coisa me conservaria. O que leva Rosine a relacionar a defecação com a destruição causada pelas mudanças. Quando fazia coco nas sessões, gritava:_ O lobo! O lobo. Ao mesmo tempo sabia que Rosine não lhe exigia que entregasse o cocô e logo tratava de escondê-lo. Então começou a ser agressivo contra ela e a partir desse dia não se sentiu mais obrigado a fazer cocô durante a sessão, empregou substitutos simbólicos como a areia. Não sabia diferenciar entre ele próprio, os conteúdos de seu corpo, os objetos, as crianças e os adultos que o cercavam. Certa vez, correu para a janela, abriu-a e gritou: _ O lobo! O lobo! E vendo sua imagem no vidro bateu nele, gritando: _ O lobo ! O lobo! “Para ele, todos os conteúdos estão unidos no mesmo sentimento de destruição, permanente de seu corpo, que, por oposição a esses conteúdos, representa o continente, e que ele simbolizou pela mamadeira quebrada, cujos pedaços foram enfiados nesses conteúdos destrutivos.”
Depois disso, ele exorciza O lobo. Passou a diferenciar os conteúdos do seu corpo do ponto de vista afetivo. Através do esvaziamento do penico e das interpretações de Rosine. Tinha adquirido a idéia de permanência de seu corpo. Suas roupas eram para ele o continente, e quando precisava tirar a roupa entrava em crise, que chegava a durar três horas. Nessas ocasiões berrava: _O lobo! Correndo de um lado para o outro e atirando sobre as outras crianças as fezes que encontrava nos penicos.
Na fase seguinte, Rosine se torna O lobo! A agressividade estava voltada contra ela. Rosine coloca-se no lugar de mãe esfomeadora. Obriga ela a derramar uma mamadeira, privando-o assim de sua comida boa. Grita:_o lobo! Essa mamadeira passa a representar a má comida, e reenviava a separação de sua mãe que o havia privado de comida e a todas as mudanças que havia sido obrigado. Ofereceu a ela também outro papel, o da mãe má que vai embora. Noutro dia, reagiu quando havia visto Rosine ir embora outras vezes e sem poder exprimir a emoção que sentia, fez xixi nela num estado de grande ansiedade e agressividade também. Essa cena teve como resultado carregá-la de todo o mal que tinha sofrido e de projetar O lobo nela. E a partir disso houve uma mudança total no comportamento de Roberto, dando a impressão de que ele tinha exorcizado O lobo!
Então passou a regressão intra-uterina, quer dizer a construção de seu corpo. No início, excessivamente agitado, tomou consciência de uma certa realidade de prazer, e tudo terminou em duas cenas capitais. A primeira delas, inteiramente nu na frente dela, pegou água com as duas mãos juntas e fez escorrer pelo corpo, repetindo duas vezes: _Roberto, Roberto. Outra vez pegou o leite, derramou sobre o corpo, especialmente sobre o pênis com grande prazer. Tomou o pênis sobre a mão e mostrou a Rosine.
Nas fases subseqüentes passou ao estádio da construção oral. Depois do batismo pela água e pelo leite, Roberto começou a viver a simbiose que caracteriza a relação primitiva mãe-criança. Mas quando a criança vive essa relação verdadeiramente, não existe problema em relação ao sexo. Mas não nesse caso, uma vez que Roberto não podia conviver com meninas. Ele devia fazer uma simbiose com uma mãe feminina o que o colocava diante do problema da castração. O problema era chega a fazê-lo receber a comida sem que isso implicasse a sua castração. Se recusava a receber de Rosine o alimento, achando que isso poderia fazer dele uma menina. Tentou se diferenciar dela, oferecendo comida e dizendo: _Roberto, depois se apalpando e dizendo:_Não Roberto. Roberto observava que depois que ele era atendido, subia para atendimento as outras meninas que Rosine atendia, por isso era uma questão de castração. A situação fazia com que ele se sentisse menina porque era uma menina que fazia romper essa simbiose com ela. O quadro clínico dele mudou, as perturbações motoras desapareceram e passou a ser mais amigável e protetor das crianças menores.
Depois Rosine sai de férias e durante sua ausência o comportamento dele se mantém como era. Soube-se que quando Roberto fora operado (antrotomia, aos cinco meses), não havia sido anestesiado, e que durante essa operação dolorosa, se mantinha a força em sua boca uma mamadeira de água açucarada. Esse episódio esclareceu a imagem que ele tinha de uma mãe esfomeadora, paranóica e perigosa que o atacava. Suas fantasias oral-sádicas tinham se tornado realidade.
Ultimamente Rosine precisou confrontá-lo com a realidade, pois ela esteve ausente durante um ano e voltou grávida. Começou a brinca com fantasias de destruição dessa criança. Durante o parto o marido dela continuo o tratamento. Quando voltou com a barriga lisa, percebeu que Roberto estava persuadido de que suas fantasias tinham se tornado realidade, que ele tinha matado a criança e que agora ela iria matá-lo. Ficou extremamente agitado até que pode dizer. Então Rosine levou o bebe até ele para que ele pudesse fazer o corte e seu estado de agitação caiu brutalmente. No inicio do tratamento nessa criança havia apenas o real e não havia nela nenhuma função simbólica e ainda menos imaginária.

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Espaço de Psicanálise de crianças e adolescentes da BFC convida para:

Uma visita ao Seminário XXIII de Lacan O SINTHOMA.
Maria Angélica Carreras abordará:
• Do acting out ao sintoma - sinthoma numa adolescente.
• Saber -Fazer.
• A metáfora paterna revisitada.
• Que encontra Lacan em Joyce para continuar avançando? Outra forma de Gozo.
Próxima terça-feira 24/08 as 15 hrs -
Sem custos/convite
Biblioteca Freudiana de Curitiba
Hermes Fontes, 792 - Batel
Fone 3342 6238
Coordenação: Lindamar Luiza Bottega Vendruscolo